terça-feira, 10 de julho de 2012

Sobre pássaros e tempestades

Minhas asas surgiram dos teus abraços


Hoje posso dizer com segurança - e talvez seja o único semestre que posso afirmar isso - que fiz o meu melhor. Fiz o meu melhor e acima de tudo consegui me manter inteira. Fiz o meu melhor para cada desafio que se apresentou. Talvez não tenha sido o absolutamente melhor, mas quando se tem tão pouco tempo para se alcançar tão alto, o teu melhor chega a ser mais do que o melhor absoluto. 

 Não tirei A em tudo, não. Mas fiz tudo, tudo. Fiz tudo com quase teimosia, fiz até o fim, fiz dar certo, fiz ser o melhor que poderia. E também me mantive inteira. Nos mantive inteiros. Me diverti, relaxei, relaxamos. E mesmo assim conseguimos. O meu melhor. Mesmo frente às dificuldades, fomos lá e conseguimos. Ninguém pode nos impedir de alcançar o que queremos. 

 Hoje o dia foi turbulento. Minha manhã já era tarde, e o fim era somente o começo. O semestre acabou, finalmente. Achei que pudesse nunca acabar. E mesmo tendo acabado, me parece só o começo de uma escada muito maior. Hoje minha universidade entrou em greve. Hoje recebi a confirmação oficial da minha viagem para o Reino Unido. Mas se a greve começou, e o semestre não acabou - oficialmente - como fica minha viagem? Quando poderei viajar? Irão eles me impedir de alcançar?

 Esse ano foi turbulento, mas de uma forma agradável. Como aquela sensação de paz que vem logo antes da tempestade. Tantas coisas definidas, feitas, pensadas, sonhadas. Os dias correm, um perseguindo o outro, e me vejo aqui no meio, quase sonhando. O dilema da viagem é algo tão profundo. O medo de ir, o quase desejo de ficar - na segurança, nos braços, na certeza do amanhã - e também o sonho de partir - de alçar vôo, de conhecer, de mudar, de ser o mundo todo. O medo do desconhecido, da solidão, da incerteza, da saudade. Saberão eles, naquele inglês acentuado, pronunciar saudade?

 Em setembro vôo para tão longe. Primeiros de setembro. Comemorar o 20 de setembro de bota e bombacha à sobra do Big Ben, pode isso? Não sei. Não tenho sabido muito ultimamente. The more I learn the less I know. Só sei uma coisa. Vou dar o meu melhor, e isso ninguém pode impedir. Que a mediocridade fique para os medíocres. Eles não sabem voar tão alto.

sábado, 3 de março de 2012

Desolation Row




terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Cãocanhar


Helena tem um cachorro, que apesar de caramelo, é rabugento. Mas ele consegue adoçar a casa toda por existir. Aquiles é um pouco idoso, carente e nem toda a atenção do mundo é suficiente. Para fazê-lo sorrir fingimos estar numa festa onde ele é a cereja mais desejada do bolo, o cão mais especial. Então tudo fica alegre.
E ele late quando eu bato a porta até perceber que sou eu.  Depois, vai à frente, espera eu sentar e deita ao meu lado para demonstrar que sentiu saudade e receber carinho. Não importa quanto tempo eu demore a voltar.
Aquiles me conquista pela sua maneira de ignorar as brigas e seguir brincando sem rancor. E mesmo sabendo que faz algo errado, ao que parece, repete para me fazer rir. Porque quando Helena briga, eu rio, com ele, por dentro.
Os pelos de Aquiles, são como os cabelos de Helena e os olhos também. Suas personalidades se parecem às vezes: os medos de tormentas e artifícios, o tédio repentino, o carinho e a ansiedade. Aquiles come de tudo, como um saquinho sem fundo! Helena é mais controlada.
É um cão bem chantagista, no melhor dos sentidos. Às vezes, ele me chama para brincar, corre com a bolinha na boca até a guia, olha para ela, depois para a porta e sem falar nada, já sabe que eu irei entender. É hora do passeio!
Comigo Aquiles corre e se comporta bem, como se nós fossemos uma equipe de amigos de infância. E foi assim que fizemos parte um da vida do outro e dormimos juntos na última noite. Sinto nele ingenuidade e bom coração. E não importa se o dia está nublado, um faz o outro sorrir. Ele é o melhor cachorro que eu já tive, mesmo sem ser meu.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Fugindo...


Helena foi a primeira pessoa que eu quis ver quando voltei de viagem, contudo ela foi a última, nos vimos por acaso. Ela andava ocupada com a vida que seguiu na minha ausência. Vida ótima e cheia de cultura. Viva! Acontece que eu, tinha erradamente para mim, que Helena ainda estava comigo, mas, na sua opinião, todos estavam com ela, mais fortemente aqueles que se fizeram presente em sua nova rotina.
No fundo, eu me enchi de frustrações infundadas pelo meu desejo de estar com ela e não conseguir. Pela minha vontade de dizer sobre a minha saudade e outras tantas coisas que eu não pude. Então, quando vi Helena eu, pura e simplesmente, paralisei em meio a um vendaval de sentimentos. Lá estava eu entre a lástima e o bem querer.
Mesmo assim, do meu jeito torto, não a recusei. Ao mesmo tempo, não a recebi desarmada, eu me sentia confusa. Mas as nossas trocas de carinho foram me dissolvendo e quando eu, enfim, correspondi Helena havia mudado. Não sei bem se com o vento sul ou com a chegada de outras pessoas. Algo nela havia mudado completamente e eu não sei, nem nunca soube como agir nestes momentos. Helena estava arredia e ríspida. Ferida, talvez...
Num lapso de preocupação perguntei três vezes se ela estava bem, mas Helena não estava mais comigo. Meu abraço estava frio, no seu olhar pairava a névoa de tristeza. Eu precisava ir para casa com minhas próprias pernas e meus sentimentos soterrados. Helena precisava fugir.

"

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Ventando...


Helena tem pés de vento. E quer sempre ir mais alto e mais rápido até ficar exausta, a partir daí, ela passa a não querer mais nada. Conhecê-la é, não mais, do que tentar reconhecer o que sobrou do ontem nas primeiras horas da manhã seguinte. E o que me assusta é a impressão de que volta-e-meia, nada restou.
Helena exige de mim toda a força. E as vezes lhe digo “adeus” pensando em não voltar. Mas, ainda mantenho a esperança, pequena como o meu tamanho, de que eu voltarei amanhã ou no ano que vem. Não consigo entender o porque de Helena estar no meu destino.
Agora consigo ver quando os olhos dela mudam de um instante para outro e depois ela tentando esconder o descontentamento ou tentando controlar sua falta de controle. Então, ela vai avançando sem olhar para trás e se auto-entristece quando retrocede. Num momento vejo-á expandir-se como uma galáxia e noutro ela é, ou quer ser, um átomo totalmente voltada para si num lugar inatingível.
Helena é como um peixe que mergulha bem fundo em si mesma e que n’outras horas se sente completamente em casa em um cardume novo, recém chegado do norte.
Helena tem arestas que me ferem, não intencionalmente. Na verdade, eu me firo nas incertezas dos olhos dela e no silêncio que nos invade a cada viagem. E quando volto, eu concluo que nada restou e me sinto fracassada. Porque no fundo eu queria a sua reciprocidade, mas as tempestades de verão são livres para existir independente do meu querer. Assim como eu, que sou livre ao tentar permanecer no mundo dos vendavais soprados pelos pés de Helena.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Eletrocardiograma

Quando conheci Helena, numa noite nublada, a ignorei. Mas ela não fez o mesmo. E depois das milhares de doses que eu bebi naquela noite, lembrei dos filmes que comentamos e dos seus olho no outro dia. Os olhos de Helena foram tão marcantes que eu nem prestei atenção nas suas pernas.
Quando eu conheci pela segunda vez Helena, tive a falsa impressão de que ela já havia feito sexo com mais da metade dos rapazes e raparigas que eu conhecia. E eu mal conseguia acreditar que ela, tendo contato com a maioria deles, nunca tivesse cruzado seus olhos nos meus.
Quando eu conheci Helena, eu não a conheci. Talvez eu ainda não a conheça depois deste mais de um ano de conhecimento. Me soa bastante estranho dizer e aceitar esta condição de não-conhecimento, mas foi assim que eu não conheci Helena e não conheço a maioria das pessoas, inclusive a mim mesma.
Os olhos de Helena são, provavelmente, únicos. E apesar dela saber e até se gabar disso falando “Sim, eu sei que todos me querem” ela age displicentemente. Helena tem um momento de olhar que me petrifica e em silêncio eu digo “Eu poderia morrer agora.” Mas morrer com um olhar não está, nem nunca esteve, na moda e nem na minha lista de coisas para fazer hoje.
Quando eu não-conheci Helena, pois já disse que até hoje não a conheço direito, ela esperava um filho só seu. Fruto de uma produção coletiva. Era uma flor forte e brilhante que crescia com o passar dos dias em um pote de margarina. Aliás, voltando um pouquinho no tempo, preciso dizer que ela tem um jeito de agir descontrolado – para aqueles que ainda acham que têm algum controle sobre as coisas do mundo, no caso. – Ela não se importa em mostrar o corpo e se divertir loucamente consigo mesma transgredindo todas as “normalidades”. Assim, para Helena, despir-se em público é apenas uma forma de dizer “vem gente! Vamos fazer o que temos vontade neste momento!”. Acontece que esta gente, que não tem coragem de tentar conhecer Helena, acaba mal interpretando as suas atitudes e classificando-a em gavetas que não lhe cabem. Helena é como um trianglo num mundo esférico. Meu mundo, apesar de esférico, é de silicone como os alargadores das orelhas de Helena. E ela me disse que todos aqueles que tentaram aparar suas arestas, saíram quicando para outros lugares, tal qual bolas de borrachas.
Helena diz não se importar com o mundo, nem com os outros, mas não fala isso de verdade, se falasse, não seria vegetariana, nem escreveria sobre mulheres, não se magoaria por dizerem que ela é louca ou estranha, não sentiria ciúme, nem desejaria outras mulheres platonicamente. Além disso, ela não ficaria confusa quando alguém está triste por algo que ela fez sem perceber. Já encontrei Helena triste por algo que ela não fez, mas se culpou.
A parte que eu conheço dela não faz planos, nem pensa no “daqui a pouco”. Acho que Helena prefere não pensar em nada, esta é a sua forma de escudo. Porque no fundo ela se importa, mas tem um pouco de medo de tudo: dos planos que podem não dar certo, das pessoas que podem não valer a pena e de todas as regras que tentam nos controlar. Já me disseram que Helena não vale a pena e talvez ela ache isso de si mesma, no fundo, mas hoje eu não a conheço para afirmar ou negar essa hipótese.
Mesmo que eu não conheça Helena, e que ouça ventos dizendo que todas os caminhos levam ao abismo, eu gosto quando ela segura a minha mão para andar. E curto quando ela me conta sobre suas viagens, que eu nunca farei. Cinema, arte, teatro, fotografia... e das suas dancinhas engraçadas. Mais do que isso, eu gosto do que Helena significa. E eu fico observando quando ela fala muito e ouço com paciência por horas, então, “do nada” ela pára e sorri com a boca, com os olhos e me estende a mão. Então eu me sinto bem por fazê-la alegre naquele momento.
Entre todos os meus bloqueios e frases guardadas, já disse que ela está sendo o meu ponto de equilíbrio, neste momento. Helena tem muitos momentos e pouquíssima linearidade. Acho que ela e eu somos um eletrocardiograma.


quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Milhões de frases sem nenhuma cor

Quase todas as mulheres - por que agora passei a me ver mulher, e não menina... ou ao menos assim me chamar - ao meu redor tem gatos. Eu resolvi suportar sozinha minha própria solidão. Sozinha. Gatos já nos significaram desapego. Hoje vejo pouco além de dúvidas, e lagrimas escondidas por trás de olhos brilhantes. Confesso que um miado na varanda me trás esperança. Em certos dias nublados o ronronar em meu colo acalmaria meu não-dormir.

Minha geração parece impregnada de solidão. Cada vez mais próximos, cada vez mais na multidão. E mais sozinhas. As mulheres fortes, cada vez mais frágeis. Não há um rosto que não passe um pingo de cansaço, de desesperança. Se agora fosse um filme, agora seria o momento dos vídeos curtos de confissão. E elas todas falando com vozes e línguas e palavras e sotaques diferentes exatamente as mesmas emoções. Tiraram de mim o que eu tinha de mais precioso. Onde esqueci minha paz de espírito? Não há ninguém que possa me oferecer um abraço? Me sinto sozinha e me escondo dentro de mim mesma. Me sinto solitária. Solitária. Me devorando por dentro. Solitária.

Essa solidão coletiva é quase irônica. Se não fosse solitária.

Os gatos dominando nossos corações. Os homens partindo. Os gatos nos trazendo aconchego. Os dias nos trazendo vazio.

She comes and goes