sexta-feira, 6 de maio de 2011

De sonhos e anseios

Me sopram suspiros de um mundo distante ao pé do ouvido em noites quietas. As manhãs lentas parecem me compelir a algo que não perfeitamente compreendo. Não traduzo as palavras que alcançam meus pés com o rumor da terra. Sinto, sem entender. Os muros de concreto, as janelas de vidro, o aço frio, cruel, transforma em caos o que era clareza, o que era límpido. Me sabotam os sonhos, alegando serem utópicos, impossíveis, ou  com simples sorrisos velados. Os tempos são outros, não há lugar para heróis, é o que ouço quando despejo meus anseios por sobre a mesa do jantar. Calam-se frente à dor e afirmam ser aquela a realidade imutável, para em seguida gritar o gol a plenos pulmões. Que tolice conhecer as pessoas, o que há de bom a conhecer? O que irá verdadeiramente conhecer? Nada do que dizes vale a pena. A cada sonho, as mesmas palavras. Mais fácil esconder por trás do vidro dos olhos o que alguma vez fora do que polir e resplandecer suas utopias em pleno dia. Isso são idéias de adolescentes, é preciso amadurecer e fazer o que se deve. Ou ainda pior, também já sonhei com a estrada, com o estrangeiro, mas um dia isso passou. Não posso admitir fechar a mente às forças que me impelem a ser algo mais que o simples dia após dia, passo após passo. Os suspiros do vento, nos raros momentos de clareza, me contam de terras distantes, de pessoas singulares, de algo fora desse lugar comum. Não me posso aceitar olhar sem realmente ver, escutar sem realmente ouvir, viver sem realmente conhecer. Não sei fazer simples esse horizonte que me aparece tão colorido, multi facetado, tão vasto, que me aparece em sonhos como se fosse a única possibilidade.

A estrada, la ruta, the road. O sentimento tão único de ao mesmo tempo em que se é livre, se voa qual pássado, se sente o vento acariciar os cabelos, também se é preso à estrada sempre em frente. Sem desistir, sem retornar. Sempre em frente. Sem precisar chegar, não há onde chegar, simplesmente ver, sentir, tocar, viver. Um fascínio que de certa forma faz parecer ser o único lugar onde se tem genuína tranquilidade, como se os pés se sentissem presos quando não tocando terras desconhecidas.

Meus sonhos me levam sempre mais longe. Não se pode, não vale a pena, se deve ter responsabilidade. Guarde sua responsabilidade com suas próprias limitações - geográficas ou não - que não há maior responsabilidade do que se responsável pelos outros. Não afogue em mares de indiferença o espírito aventureiro, sei que não só a mim se assemelham a prisões essas casas e prédios e ruas, e concreto, e buzinas, e vidro e aço frio por todos os lados que se olha. Consigo ver no fundo de seus olhos frios, amordaçado e preso, o desejo de também se ver livre, e por fim ver. Saber. Quero percorrer cada centímetro dessa terra, e conhecer cada drama e cada sorriso, ouvir as vozes e sentir os rios. Para poder então com firmeza afirmar que sim, eu vi, eu sei, eu vivi.

Vem comigo?

¿Cómo es posible sentir nostalgia por un mundo que nunca conocí? (Ernesto Guevara, Diarios de Motocicleta, 2004)
It's a dangerous business, going out your door. You step onto the road, and if you don't keep your feet, there's no telling where you might be swept off to.(Bilbo Bagging, Lord of the Rings, p.76)