quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Lírio avermelhado.

Você não ficou para ver os lírios. E eles rasgaram a terra vigorosamente chamando a atenção de todos, como você, outrora. Como a solidão, muita gente ocupou-se comigo: puseram boa música, recitaram poemas de amor enquanto as flores dilaceravam a minha pele, as minhas noites. Eu sorri a eles, falsamente.

Reguei seus lírios com minhas lágrimas e pedi aos deuses para que eles amanhecessem secos, amarelados. Mas eles eram forte. Eles eram...

No inverno as flores mantinham no seu lugar o cheiro de terra úmida e em potência aquelas flores brancas, eu clamava por paz. Muitos amigos roubaram mudas, levaram buquês para seus amores. Pássaros brincaram nos lírios enquanto eles me ardiam como chibatadas.

Então reencontrei aquela velha rede, escondida há anos dentro de um baú onde guardei teu cheiro. Por alguns momentos me deixei embalar por ela, pelo vento, no ritmo da desgraça dos seus lírios, me deixei desgraçar mais ainda na nossa varanda. Li alguns livros nos próximos dias, cinco ou seis. E da varanda via o tempo se fechar, anoitecer as 15h30 e nem a enxurrada era capaz de carregar o peso da minha alma. O vai-e-vem da lembrança da sua pele revigorava-se a cada vez que eu cruzava as escadas da frente habitada pela melancolia.

Eu comprei mil litros de vinho para amenizar minha desesperança e numa noite adormeci. Você entrou pelo jardim correndo e a maciez dos seus cabelos beijava o vento. Usava aquele vestido de verão e irradiava mais felicidade do que o sol. Que saudade eu sentia do seu sorriso. Senti seu cheiro doce quando nos abraçamos e eu não precisava de mais nada para ser feliz, entramos em casa e você nos fez panquecas enquanto eu passava um café fresquinho para nós. Lhe mostrei as pequenas bem feitorias que fiz em casa na sua ausência e você gostou. O nosso quarto ainda estava igual. Sua pele continuava a mesma e amamos como no primeiro dia em que entramos no nosso lar. Você adormeceu sorrindo, por trás das pálpebra rosadinhas haviam olhos luminosos de sentimento bom. Exausto e maximamente feliz, adormeci nos seu corpo; acordei com o seu cheiro, cheiro de lírios. E imerso nos lírios que você nunca quis ver suspirei. Eles estavam ainda mais brancos, como a sua pele, exalavam você pelos poros, balançavam com o vento que um dia brincou nos seus cabelos quando os plantamos numa manhã animada de sábado.

Fui ao supermercado e comprei tudo o que você mais gostava, eu te aguardava como nunca. Tomei banho, fiz a barba depois de meses e me pus digno de receber a pessoa mais esperada e desejada do universo. Jantei sozinho, você ligou atrasada, estava presa no transito da nossa cidade no fim do dia, mas não demorava. Mal podia esperar!

... os ponteiros giraram consecutivamente e a tempestade se fez novamente, nos meus olhos. Raios brindaram ao meu sentimento na nossa varanda; o vento revolveu a terra; e as flores brancas fecharam-se para não morrer. Tingi seu lírios com o vermelho do meu desespero.

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